Audiência Pública discute projeto que prevê fornecimento gratuito de remédio à base de Cannabis
Medicamento seria oferecido pelo SUS para famílias que não têm condições de comprá-lo
O Estado de São Paulo pode, em breve, fornecer gratuitamente medicamentos derivados da planta Cannabis para famílias que não têm recursos para importar o remédio de alto custo. Esta é a proposta do Projeto de Lei º 1.180/2019, do deputado estadual Caio França (PSB), que será discutida nesta segunda-feira (25) em audiência pública na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), a partir das 10 horas.
"A ideia é que o Governo do Estado faça a distribuição dos medicamentos que já são permitidos pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Hoje, quem precisa e não tem recurso, precisa ingressar na Justiça. Isso tem que mudar", diz o parlamentar.
Desde 2015, a Anvisa autoriza a prescrição médica da Cannabis de forma individual para cada paciente.
A dificuldade fica por conta da compra do produto. Com a comercialização proibida no Brasil devido às leis antidrogas, o medicamento tem de ser importado. Todo esse trâmite faz com que o produto chegue a custar cerca de R$ 600,00 o grama. Alguns pacientes precisam de 200 miligramas por dia.
O medicamento tem sido usado para pacientes com epilepsia, autismo, dores crônicas, Alzheimer, esclerose múltipla, entre outros. Substâncias como o canabidiol e o tetraidrocanabinol (THC) têm efeitos ansiolíticos, antidepressivos e anti-inflamatórios.
A moradora de Santos Neide Martins sabe da importância do remédio para a qualidade de vida do paciente. Ela é mãe de Victor Gabriel, de 7 anos, que tem epilepsia refratária e foi diagnosticado tardiamente comas síndromes de West e Lennox-Gastaut.
"Ele chegou a falar e andar precocemente, mas, devido às crises, foi perdendo isso. O Victor chegava a ter 80 convulsões por dia. Meu medo maior sempre foi ele não voltar de uma dessas crises", conta.
Caminho difícil
Neide enfrentou muita burocracia para conseguir receber pelo Estado o remédio à base de Cannabis. Meses depois de começar o tratamento, a Síndrome de Lennox desapareceu e, no ano passado, foi a vez da de West. Victor voltou a falar e já consegue andar trechos curtos fora da cadeira de rodas. "É óbvio que foi o canabidiol", afirma Neide.
Ela lembra que ajudou uma outra mãe com todos os trâmites burocráticos para conseguir a autorização da Anvisa para a importação, uma vez que a família não tinha recursos para comprar o medicamento. "Há duas semanas, o filho dela morreu sem o tratamento. É uma corrida contra o tempo e a distribuição pelo SUS ajuda muito".
O advogado e membro efetivo da Comissão de Direito Médico e Saúde da OAB/SP, Leonardo Sobral Navarro, também ressalta a importância da proposta. "Esse projeto é o primeiro passo do Legislativo no País inteiro e pode ajudar a acabar com a judicialização servindo de modelo para os outros estados".
A psiquiatra e psicanalista Eliane Nunes, diretora geral da Sociedade Brasileira de Estudos de Cannabis (SBEC) afirma que essa discussão é muito importante, mas destaca que os detalhes têm que ser aprofundados. "É necessário delimitar quem são as pessoas beneficiadas para não quebrar o Estado e onerar o SUS", adverte.
A Tribuna - Egle Cisterna