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Por que a liberação da maconha medicinal pela Anvisa não agradou completamente os ativistas da causa

Por que a liberação da maconha medicinal pela Anvisa não agradou completamente os ativistas da causa

Órgão federal aprovou venda e registro de medicamentos a base de cannabis, mas com restrições aos fabricantes brasileiros. Defensores do uso medicinal consideram que esse é apenas o primeiro passo

DIOGO MAGRI
São Paulo - 03 DEC 2019 - 18:18 BRT

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou nesta terça-feira a comercialização de medicamentos feitos a base de cannabis, a substância da maconha, para uso medicinal em farmácias do Brasil. A medida foi aprovada por unanimidade, passa a valer 90 dias após a sua publicação no Diário Oficial da União e tem validade de três anos, quando pode ser revista. Também nesta terça, a Agência vetou a proposta que previa autorizar o plantio e cultivo de maconha para fins medicinais, o que obriga o insumo comercializado a ser importado pelos fabricantes. Apesar de ser considerado um passo importante na aceitação do uso da cannabis como medicamento, a liberação não agradou totalmente os defensores da maconha para tratamento de doenças.

O regulamento aprovado pela Anvisa exige que as empresas fabricantes tenham um certificado emitido pela agência, autorizações especiais, documentações técnicas e condições operacionais de controle. "A Anvisa pressupõe que a empresa construirá um bunker para produzir o medicamento. Parece que estão preocupados com uma bomba nuclear", opina Leonardo Navarro, advogado especialista em direito à saúde. "Eu não conheço nenhuma empresa brasileira que cumpra esses requerimentos", avalia.


Para o advogado, a regulamentação da Anvisa junto com a proibição de cultivo em solo brasileiro torna obrigatório o uso de cannabis importado na comercialização dentro do Brasil. Ele defende que a medida da Agência não contempla a demanda da sociedade, uma vez que, apesar da ampliação da possibilidade de registro, os medicamentos do exterior chegam ao Brasil com um valor muito alto. "O histórico de derivados de cannabis regularizados no Brasil contempla só o Mevatyl, produto importado cujo custo do frasco é de 2800,00 reais. E isso continuará sendo um divisor de águas na acessbilidade ao tratamento".

Além da exclusividade aos importados, os critérios estabelecidos pelo órgão também dificultam a produção dos medicamentos entre associações e ONGs que trabalham pelo acesso de pacientes à maconha medicinal em território nacional. "A medida vincula a venda de cannabis à indústria farmacêutica", reclama Navarro. "Existem ONGs que desenvolvem um trabalho avançado no campo, com médicos, bioquímicos, famarcêuticos e pacientes que apresentam um resultado, e esse regulamento inviabiliza o trabalho delas. Elas representam um estudo científico que o Governo não está regularizando", completa.

Os remédios comercializados não serão classificados como medicamentos nos três primeiros anos de medida, mas representarão uma nova categoria: "produtos à base de cannabis". Eles só poderão ser vendidos em farmácias e drogarias sem manipulação e sob prescrição médica. As substâncias extraídas da maconha agem comprovadamente como antidepressivos, analgésicos, sedativos, estimulantes de apetite e anticonvulsivos e são eficazes em tratamentos de doenças como epilepsia, mal de Parkinson, esclerose múltipla, esquizofrenia, asma e dores crônicas.

Navarro reforça que, a fim de contemplar uma regulamentação maior do que o que a Anvisa fez e democratizar o uso medicinal do cannabis, o Brasil deveria seguir o exemplo de países que alcançaram resultados produtivos sem abolir o veto à droga. "Em alguns países, o plantio é feito em bases do exército. Existem diversas maneiras de viabilizar o cultivo para que as empresas tenham acesso à matéria-prima sem mexer na proibição do uso recreativo", diz. A impossibilidade de cultivar a planta para fabricar o medicamento em território brasileiro, de acordo com o advogado, é o maior impeditivo para a produção no país. Segundo a Anvisa, caso algum fabricante deseje se aventurar no Brasil, ele deverá "realizar a importação da matéria-prima semielaborada, e não da planta ou parte dela'.

A decisão da Anvisa não pode ser vetada, mas passará por avaliação em três anos. Governo ou Congresso também podem propor uma medida contrária à medida do órgão. Navarro levanta a possibilidade de uma movimentação legislativa a favor de novos critérios sobre o uso da maconha medicinal no país em 2020, uma vez que o tema está sendo discutido em projetos de lei. "A tendência é de ter uma regulamentação ampla para viabilizar o cultivo medicinal por quem quiser no Brasil, desde que cumpra alguns requisitos. Deve contemplar mais casos do que a medida da Anvisa", afirma o especialista em direito à saúde. "A entidade acerta ao tratar do assunto porque nunca havia abordado o registro desses medicamentos de forma efetiva. Mas, com esses critérios específicos, afasta o trabalho importante de associações e ONGs. É um passo adiante, mas que não contempla as demandas da sociedade".


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